Meu paciente vai operar. Quais exames pré-operatórios preciso pedir?

Vamos aprender de vez, quais exames eu preciso pedir, e quando preciso pedir, para liberar um paciente pra cirurgia.

A 3a Diretriz de avaliação cardiovascular perioperatória da Sociedade Brasileira de Cardiologia, que foi publicada em 2017, discute claramente a utilização  inadequada dos exames rotineiros no pré-operatório.

Um exemplo citado são as operações de catarata – uma revisão sistemática de três estudos randomizados que compararam a ocorrência de complicações entre grupos que realizaram ou não exames pré-operatórios foi realizada. Esse estudo mostrou que a taxa de complicações era semelhante entre os dois grupos, e a realização dos exames não aumentou a segurança do procedimento, além de se associar a custo 2,5 vezes maior que no grupo que não os realizou.

Para outros tipos de cirurgia, a Diretriz cita um outro estudo randomizado, que comparou o efeito dos exames pré-operatórios em indivíduos de baixo risco clínico, sem comorbidades e submetidos a cirurgias de pequeno porte. Este estudo também não mostrou diferença de morbimortalidade perioperatória entre os que realizaram e não realizaram os exames pré-operatórios.

Esses dados apontados pela diretriz deixam claro pra gente: NÃO HÁ INDICAÇÃO DE EXAMES ROTINEIROS NO PRÉ-OPERATÓRIO DE PACIENTES ASSINTOMÁTICOS EM PROCEDIMENTOS DE BAIXO RISCO.

Ela vai além, ao nos dizer que a indicação dos exames pré-operatórios deve ser individualizada conforme a história, o exame físico, as doenças apresentadas pelo seu paciente, além do tipo e porte do procedimento cirúrgico. Então, vamos ver quais são as situações onde, de fato, as evidências apontam para um benefício em realizar alguns exames pré-operatórios específico     

Quando fazer cada um desses exames?

Vamos começar pelo ECG:

Quando precisamos solicitá-lo, segundo a Diretriz da SBC:

-História e/ou anormalidades ao exame físico sugestivas de doença cardiovascular;

-Pacientes submetidos a cirurgias intracavitárias, transplantes de órgãos sólidos;

-Cirurgias ortopédicas de grande porte e vasculares arteriais;

-Alto risco de eventos estimado por algoritmos de risco cardiovascular pré-operatórios (nós já abordamos esses escores no nosso último texto – confere lá);

-Presença de diabetes mellitus.

Outras indicações, porém com menor grau de recomendação, seriam obesidade e idade superior a 40 anos.

Já em relação à radiografia de tórax…

A Diretriz é bem clara: a única indicação inquestionável para solicitar é a história ou propedêutica sugestivas de doenças cardiorrespiratórias.  Novamente, temos outras duas indicações, porém com menor grau de recomendação: idade superior a 40 anos e intervenções de médio a grande porte (sobretudo torácicas e abdominais).

Falando do hemograma completo:

Aquele que todo mundo acha simples, bem básico… Então esse a gente pede pra todo mundo né? Errado de novo! As indicações para esse exame são:

-Suspeita clínica de anemia ou doenças crônicas associadas à anemia;

-História de doenças hematológicas ou hepáticas; 

-Intervenções de médio a grande porte, com previsão de sangramento e necessidade de transfusão.

Outra vez, a idade maior que 40 anos entra como indicação com menor grau de recomendação.

Coagulograma:

Outro queridinho na hora de pedir exames pré-operatórios é o coagulograma – as provas da coagulação. Nesse caso, devem ser solicitados apenas em casos de pacientes em uso de anticoagulação com varfarina; insuficiência hepática; portadores de distúrbios de coagulação (entrando aqui pacientes com história de sangramento; e intervenções de médio a grande porte.

Creatinina sérica:

Por fim, a Diretriz fala sobre quais circunstâncias devemos pedir a dosagem da creatinina sérica, para avaliar a função renal do nosso paciente no pré-operatório. São elas:

-A presença de nefropatia;

-Diabetes mellitus;

-HAS;

-Insuficiência hepática ou cardíaca;

Ausência de um exame de creatinina dos últimos 12 meses; 

-Intervenções de médio a grande porte;

Pacientes com idade superior a 40 anos entram com grau de recomendação mais baixo mais uma vez.

Como podemos notar, a maioria das indicações para solicitar esses exames vêm de dados da história e exame físico dos pacientes. Não existe nenhuma evidência que sustente sair pedindo exames pra todo mundo que vai operar. Nem para pedir um pacote básico de exames iguais para todos os tipos de pacientes do seu ambulatório.

Agora você já tem conhecimento pra solicitar os exames certos para os pacientes certos no contexto de pré-operatório, sabendo exatamente porque faz (e porque não faz) cada uma dessas condutas. 

Continue acompanhando o nosso blog; nosso próximo texto vai falar dos medicamentos que precisamos suspender e/ou manter no pré-operatório dos nossos pacientes; e aproveite pra entrar a nossa plataforma Jaleko e assistir o nosso curso de Anestesiologia. Lá você encontra aulas desse e vários outros assuntos importantes de medicina perioperatória. Até a próxima!

REPOST : Jaleko

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