O que é a inflamação?
A inflamação é uma resposta natural do nosso organismo, especificamente do nosso sistema imune, que acontece mediante algum estímulo. “E que estímulo é esse?” Esse estímulo pode ser um microrganismo que é um corpo estranho, e então o sistema imunológico inicia um “combate” ao mesmo, ou pode ser alguma lesão tecidual, por exemplo, um corte ou uma queimadura.
É, portanto, um dos nossos mecanismos de defesa, imediato, que visa eliminar agentes estranhos e regenerar o tecido lesado. Apesar de ser inespecífica, ela é extremamente importante para os mecanismos específicos que são desencadeados em um segundo momento.
Quem promove a inflamação?
A inflamação, como dito anteriormente, é desencadeada mediante um estímulo. Esse estímulo é reconhecido por células locais, especialmente os macrófagos, que após serem ativados iniciam a produção de importantes substâncias, como as citocinas e as quimiocinas.
As principais substâncias produzidas e presentes em um processo inflamatório agudo são IL-1, IL-6, TNF-alfa. Essas citocinas promovem diversas ações e eventos.
Uma dessas ações visa aumentar o número de leucócitos que chegam ao local, e assim ocorre a vasodilatação, aumentando o fluxo sanguíneo e consequentemente os leucócitos.
Ao serem liberadas, essas substâncias ativam células endoteliais a expressarem moléculas de adesão, as selectinas. Com isso, os leucócitos que estão circulando no sangue, principalmente os neutrófilos e monócitos, iniciam um processo de rolamento se ligando fracamente as selectinas.
Em seguida, também por estímulo das citocinas, principalmente TNF e IL-1, o endotélio começa a expressar integrinas, e nessas moléculas de adesão os neutrófilos e monócitos em processo de rolamento se ligam fortemente, e após essa forte ligação inicia-se o processo de diapedese, que consiste na passagem de tais leucócitos do vaso sanguíneo para o tecido, passagem essa que ocorre por entre as células endoteliais.
Para que seja possível a diapedese, deve ocorra o aumento da permeabilidade, ou seja, aumento do espaço entre as células endoteliais. Porém, além das células, há passagem de outras substâncias.
Os leucócitos ao chegarem no local onde há a presença de algum agente agressor ou lesão celular, iniciam sua atividade liberando mais citocinas e quimiocinas para amplificar a resposta.
Tem-se o importante processo de fagocitose, o qual os leucócitos ali presentes englobam microrganismos ou tecidos lesados e os digerem por meio da liberação de substâncias tóxicas como óxido nítrico, espécies reativas de oxigênio e lisozimas.
Os leucócitos também podem liberar suas substâncias no tecido de modo a combater os agentes ali presentes e com isso afetam tanto os microrganismos quanto o próprio tecido.
Após a destruição do agente agressor ou da digestão de algum tecido lesado (necrótico), há estímulo para a limpeza e regeneração do tecido, e a principal célula envolvida nesse processo é o macrófago.
Conhecemos então, como se dá o processo de inflamação e algumas etapas importantes. Mas, diante de tantas alterações, é esperado que aconteçam muitas repercussões clínicas desse processo, certo?!! É isso o que vamos conversar a seguir.
Sinais da Inflamação
Os sinais da inflamação podem ser facilmente explicados a partir dos mecanismos que falamos anteriormente. Temos 5 sinais flogísticos: calor, rubor, edema, dor e limitação funcional.
Começando pelo calor. Sabe quando há algum local inflamado no corpo, e quando você encosta a mão percebe na hora que está mais quente do que deveria estar? O calor local é uma manifestação presente em processos inflamatórios, sendo decorrente principalmente da vasodilatação, e assim com maior fluxo sanguíneo na região, gera também esse aumento da temperatura.
Você também sabe que locais inflamados ficam vermelhos, seja algum arranhado, uma faringite, conjuntivite, e mais uma lista enorme de condições inflamatórias. O rubor, que é essa vermelhidão, é também decorrente da vasodilatação e com o aumento do diâmetro do vaso e consequente aumento do fluxo sanguíneo local, é gerada essa hiperemia.
E outro sinal que você já deve ter percebido é que, uma área inflamada aumenta o volume. Por exemplo, na faringite, a região fica edemaciada, aumenta o volume, não é mesmo? O edema é o outro dos 5 sinais. Lembra que para que ocorra a diapedese é necessário o aumento da permeabilidade celular, e com isso podem passar substâncias?
Então, uma dessas substâncias é o fluido, que sai do vaso e se dirige em direção ao tecido e ali se acumula provocando aumento de volume. Esse fluido pode conter substâncias como água e proteínas.
E a dor local? Seguindo com o exemplo da faringite, a deglutição é dolorosa, há desconforto. Outro exemplo é um corte, o local do corte fica doloroso. Sendo assim, temos o outro sintoma – a dor – e talvez um dos mais importantes, pois afeta diretamente a qualidade de vida do indivíduo. “Mas, porque a dor acontece?” Uma das causas da dor é o edema que pode comprimir estruturas nervosas e gerar tal quadro doloroso.
Outro fator muito importante é a liberação de algumas substâncias como bradicinina e prostaglandinas, produtos da cascata do ácido araquidônico, que provocam uma hiperalgesia, ou seja, aumento da sensibilidade dolorosa, e assim ocorre a dor.
E por fim, a limitação funcional que se dá por uma união de fatores como a dor e o edema, principalmente, que acabam dificultando o indivíduo a realizar suas atividades. E o tipo de limitação varia de acordo com a localização da dor, por exemplo, se o problema é no pé, pode haver dificuldade para andar.
Sintomas da inflamação
Alguns sintomas, além dos sinais que conversamos anteriormente, podem aparecer em um indivíduo com um processo inflamatório.
Dentre os sintomas da inflamação, um sintoma sistêmico muito importante e comum é a febre. A febre é ocasionada pela liberação das citocinas que falamos anteriormente (IL-1, IL-6, TNF-alfa), sendo que o principal é o TNF-alfa (Fator de Necrose Tumoral).
Essas substâncias são pirógenos que estimulam a produção de prostaglandinas e essas atuam no hipotálamo e estimulam a elevação da temperatura.
Também por ação principalmente do TNF, pode ocorrer o emagrecimento, por estimular a proteólise, estimular a autofagia, além de inibir a fome (por reduzir substâncias orexígenas).
Análise Laboratorial
Além dos sinais e sintomas, algumas substâncias ou células podem ser dosadas. Os marcadores inflamatórios são extremamente importantes.
Diversos são os marcadores, como veremos a seguir.
Começando por dois marcadores inflamatórios muito utilizados na prática clínica, que são: VHS (Velocidade de Hemossedimentação) e PCR (Proteína C Reativa).
Proteína C reativa
A Proteína C Reativa (PCR) é um dos marcadores mais utilizados. É produzida pelo fígado e em quadros de inflamação aguda se eleva.
Sua importância se dá por elevar-se rapidamente, ou seja, em fase inicial da doença, tendo seu pico entre 36 e 50 horas. Também importante para monitorar o curso da doença, sendo possível avaliar piora ou melhora do quadro, pois ela tende a cair.
Essa proteína pode se elevar em muitas patologias como gengivite, infarto do miocárdio, neoplasias, pancreatite, artrite reumatoide, infecções bacterianas agudas, traumas, enfim, são muitas as causas para elevação da PCR.
Velocidade de Hemossedimentação
Já a velocidade de hemossedimentação (VHS), é a medida da velocidade do empilhamento das hemácias em 1 hora, estando em um tubo vertical. Em processos inflamatórios agudos, esse processo pode ser acelerado devido ao aumento de algumas substâncias como, por exemplo, o fibrinogênio.
Assim como a PCR, a VHS é um exame pouco específico para diagnosticar uma doença, pois diversas doenças podem acelerar a hemossedimentação, como infecção bacteriana, glomerulonefrite aguda, artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, hepatite, pancreatite, peritonite. Mas para confirmar o processo inflamatório é muito importante.
Hemograma
Outro exame básico, e muito importante, é o hemograma. Por meio da análise do hemograma é possível diagnosticar um processo inflamatório por leucocitose (aumento dos leucócitos), e por essa análise, avaliar qual o tipo celular está aumentado (neutrófilos, linfócitos, eosinófilos, etc). Por exemplo, uma leucocitose devido a uma neutrofilia (aumento do número de neutrófilos) é sugestiva de infecção bacteriana.
Fibrinogênio
O fibrinogênio, é um fator de coagulação (fator I da cascata), sendo produzido pelo fígado. É essencial no processo de hemostasia durante a formação dos coágulos, pois ele é convertido em fibrina, um filamento insolúvel, que forma o coágulo estável, controlando assim a perda sanguínea.
Geralmente o valor normal está entre 200 e 400 mg.
É uma proteína de fase aguda, e em inflamações sistêmicas ele se eleva, podendo ser utilizado para avaliar a intensidade do processo inflamatório.
Alfa-1 Antitripsina
Também é uma proteína produzida pelo fígado. Sua função é inativar algumas enzimas liberadas durante os processos inflamatórios, como a elastase liberada pelos neutrófilos, de modo a reduzir o dano tecidual no organismo.
Dessa forma, seus valores se elevam durante os processos inflamatórios e/ou infecciosos.
Uma peculiaridade importante é que, se a alfa-1 antitripsina estiver abaixo do valor normal indica que a ação protetora que ela realiza está deficiente, e isso pode levar ao desenvolvimento de enfisema (por destruição da elastina no parênquima pulmonar), e doença hepática.
Interleucina-6
A interleucina-6 (IL-6), é uma substância muito conhecida nos processos inflamatórios, como conversamos anteriormente, sendo importantíssima na resposta imunológica desencadeada por infecções. Também está presente em diversas doenças autoimunes.
Níveis elevados podem indicar a ocorrência de processos inflamatórios.
Ferritina
A ferritina é uma substância envolvida no armazenamento de ferro. Geralmente seus níveis são proporcionais à quantidade de ferro no organismo.
Por ser uma proteína de fase aguda, em casos de inflamação ou infecção, ela se eleva. Porém, essa elevação não é proporcional à quantidade de ferro no organismo.
Outra importante utilidade da ferritina é a pesquisa da causa entre os diversos tipos de anemia, pois se o paciente apresentar anemia e a dosagem de ferritina demonstrar valores abaixo do normal, a anemia pode ser decorrente de deficiência do ferro.
Haptoglobina
A haptoglobina, proteína produzida pelo fígado, possui como função retirar a hemoglobina livre do plasma.
Assim como as anteriores, é uma proteína de fase aguda, e em quadros inflamatórios como colite ulcerativa (uma doença inflamatória intestinal), infarto agudo do miocárdio, doenças reumáticas em fase aguda e em infecções, encontra-se elevada.
A dosagem de haptoglobina é muito importante na pesquisa diagnóstica das anemias, pois quadros de anemia hemolítica podem provocar a redução de haptoglobina, devido ao aumento do consumo.
Hepcidina
A hepcidina é uma proteína muito importante na homeostase sistêmica do ferro, ou seja, é ela quem controla o ferro plasmático. Assim, em altas concentrações leva à redução do ferro plasmático, enquanto em concentrações reduzidas aumenta a concentração do ferro sérico.
Essa ação se dá, pois, a hepcidina se liga à ferroportina – uma proteína presente na membrana de várias células como macrófagos, enterócitos e hepatócitos, sendo o poro por onde o ferro sai da célula -, e assim, quando a hepcidina se liga à ferroportina, ela impede a saída de ferro das células.
Quando ocorrem processos inflamatórios e/ou infecciosos, as concentrações de hepcdina se elevam. A importância disso é que, maiores concentrações de hepcidina reduzem as concentrações de ferro, e assim, reduz a disponibilidade de ferro para microrganismos, reduzindo assim a virulência do patógeno e controlando a infecção.
Procalcitonina
A procalcitonina é um hormônio normalmente produzido pelas células C da tireoide, e que permanece dentro dessas células.
Quando se têm processos inflamatórios extensos ou infecções sistêmicas, a procalcitonina passa a ser produzida por outras células como os macrófagos, e assim é liberada na circulação, e seus níveis são detectados pela dosagem sérica.
Esse marcador tem sido considerado um importante marcador clínico, por ter maior especificidade às infecções bacterianas, e por diminuir rapidamente quando a infecção é controlada, o que favorece muito no acompanhamento da antibioticoterapia.
É considerado também um marcador de prognóstico nas infecções sistêmicas.
Amiloide Sérico A
Outra proteína de fase aguda, produzida pelo fígado, o amiloide sérico A é importantíssimo na resposta inflamatória, uma vez que estimula a expressão a liberação de diversas substâncias como IL-1 beta, IL-18 e o TNF-alfa (fator de necrose tumoral).
Além desses estímulos, o amiloide sérico A realiza uma importante função de potencializar a opsonização de microrganismo, e assim induzir a fagocitose.
Assim, como as demais proteínas de fase aguda, o amiloide sérico A se eleva em processos inflamatórios.
Assim, finalizamos essa conversa importantíssima de hoje. E lembre-se: o processo inflamatório está presente nas mais diversas doenças, então é de extrema importância dominar bem esse assunto.
REPOST: Jaleko